sexta-feira, outubro 22, 2004

O conhecimento inútil

Às vezes passo rapidamente nas livrarias pela seção de auto-ajuda e vejo títulos como "O Segredo de Um Relacionamento Bem-Sucedido", "Como Ter Sucesso em Seu Casamento" e afins. Os nomes não são exatamente esses, mas, enfim, são livros que prometem ensinar os segredos de um relacionamento feliz. E penso comigo mesmo que, na prática, essas obras não servem para nada.

Uma pessoa experiente, inteligente, com visão e capacidade de análise, acaba enxergando por si mesma como funciona uma relação. Depois de alguns fracassos e sucessos parciais, não existe mais mistério. Ficam claros e evidentes os fatores que contribuem para o sucesso de um convívio a dois. O principal deles é compatibilidade. Mas esse conhecimento não é de muita valia na prática. Porque, mesmo que se consigam enxergar de forma cristalina os elementos que constituiriam uma relação perfeita, não se tem controle sobre eles. De nada adianta saber o que faz com que um relacionamento dê certo se não podemos mudar o que está errado. Ou podemos?

Em primeiro lugar, somos apenas 50% de um casal. Os outros 50% estão totalmente fora de nosso comando. É outra cabeça, outros sentimentos, outros valores. O que é justo para um é injusto para outro. O que é certo para um é errado para outro. Podemos dialogar, negociar, argumentar, mas não podemos mudar a outra pessoa. Até porque já é difícil mudar a nós mesmos. Os indivíduos adultos estão prontos, não são como carros danificados que, com pequenos ajustes, corresponderão às expectativas. Há quem acredite na possibilidade de mudar para melhor. É uma chance. Se os dois lados estiverem dispostos, podem se esforçar para que dê certo, com pequenas concessões. Ainda mais se for para preservar uma família. Pode não ser o ideal, mas cabe a cada um pesar os prós e contras e decidir se vale a pena segurar uma relação conturbada.

Alguns podem argumentar: sabendo como se constitui um bom relacionamento, podemos escolher o par certo e evitar os errados. Parece simples, não? O problema é que amor, paixão, gostar, ou que outro nome se queira dar a essas variações sobre o mesmo sentimento, é algo não se escolhe. Simplesmente acontece. Quando você percebe, está apaixonado. E pode ser por alguém compatível ou não. Pode também não ser correspondido. Mas se for, cria-se um relacionamento. E se houver incompatibilidade, surgem os conflitos, as diferenças, os problemas. E por mais que os conheçamos e analisemos, pouco poderemos fazer para solucioná-los. Diferenças entre duas pessoas não se corrigem. Elas apenas existem. Podemos aprender a aceitá-las, mas até isso é mais complicado do que parece.

É por isso que, enquanto existir a humanidade, as pessoas continuarão sofrendo por amor. Seguirão vivendo o dilema de amar e não ser amado, de se entregar e não ser correspondido, de suplicar e não ser entendido. Tudo seria mais fácil se pudéssemos corrigir as diferenças de personalidade ou redirecionar nossos sentimentos. Mas não conseguimos fazer nem uma coisa, nem outra. Assim, de nada adianta conhecer a fórmula de um relacionamento perfeito se não podemos aplicá-la em um relacionamento imperfeito.