terça-feira, novembro 23, 2004

Colocando em prática

Agora que decidi que vou ficar rico, a questão é: como? São tantas as opções que não sei qual escolher.

Eu poderia fundar uma Igreja, por exemplo. Contrataria alguns atores para encenar exorcismos e curas milagrosas. Venderia cadeiras cativas no Céu. Construiria templos. Anunciaria a salvação eterna para quem se convertesse. Mas teria que ser para a minha Igreja, que seria a única certa. A graça recebida por cada um seria proporcional à doação na coleta.

Ou melhor ainda: já que gosto de escrever, poderia começar a publicar livros sobre misticismo. Contaria da viagem que fiz às montanhas do Tibet, das visões que tive, dos poderes sobrenaturais que me foram repassados nesse contato. Inventaria personagens com nomes cabalísticos, contaria historinhas cheias de lições de vida e mensagens de otimismo. Falaria do disco voador que avistei e de meu encontro com John Lennon. Se não desse certo eu poderia optar pelo filão da auto-ajuda. "Acredite em si mesmo", "seja otimista", "use a força do pensamento positivo..." Basta escrever o que as pessoas querem ler e me tornar um best-seller.

Não, acho que existe outra maneira melhor: comprar uma tenda, um turbante, uma daquelas lâmpadas que soltam faíscas dentro de uma redoma de vidro e me tornar vidente. "Você veio até mim porque tem um problema. Sim, eu estou vendo. Pode ser algo que envolva dinheiro ou uma pessoa querida. Estou certo? Veja, coloque sua mão sobre a lâmpada. Vê esses raios? É a sua energia!" Pronto, não tem como errar. "Alguma pessoa que você conhece vai morrer em breve." "Você vai reencontrar um amigo." Mas nada, nada mesmo, surte mais efeito do que encerrar a consulta dizendo: "Mas as coisas vão melhorar. Você tem que acreditar. Em si mesmo e em mim. E no dinheiro que está investindo."

Eu poderia lançar também um programa de rádio para ouvir reclamações de pessoas humildes. Conseguiria patrocínio para distribuição de cadeiras de rodas, muletas e o que mais fosse preciso. Quando o meu nome estivesse em destaque, me lançaria na política. Ah, querem saber mesmo? Vou continuar pobre! Se for o meu destino estar sempre com o orçamento apertado, que assim seja. Só peço à querida Santa Hedwiges, que até hoje nunca me abandonou, que continue me livrando das situações mais desesperadoras e que eu possa estar sempre com meu nome limpo. No mais, nada como ser a gente mesmo, vivendo uma vida modesta, mas com a consciência tranqüila.