quinta-feira, junho 09, 2005

O abstêmio

Hoje a Zero Hora publicou uma matéria sobre alcoolismo, focalizando o caso específico de um gaúcho de 42 anos que conseguiu se recuperar. Mas uma passagem me chocou bastante. Quando parou de beber, aos 36 anos, a esposa com quem vivia desde os 19 se aborreceu com sua sobriedade. E lhe deu um ultimato: teria que escolher entre os Alcoólicos Anônimos ou ela. Felizmente a decisão foi certa e houve a separação. Hoje ele tem uma nova companheira com quem descobriu "o que é amar, ser amado e ser digno desse amor". Mas o que impressiona é que possa existir uma pessoa com pequenez de espírito como essa mulher.

Na verdade o abstêmio incomoda. Ele é como aquele sujeito que tem a camisa mais branca que a sua: se ele senta perto de você, o contraste faz o seu branco parecer amarelo. E você gostaria que ele sujasse logo a roupa para ficarem todos iguais e você se sentir tão limpo quanto ele. Existe entre os alcoólatras não assumidos um pacto de conivência: vamos todos encher a cara e convencer um ao outro que somos bebedores sociais. Que esse é o comportamento normal de quem vai em festas ou freqüenta a noite. Se aparecer algum abstêmio, vamos nos unir para fazer com que ele é que se sinta o errado no meio dos certos. Mesmo assim, no fundo, os bebuns é que se irritam em ver que há pessoas que conseguem viver bem sem o álcool.

O caso dessa ex-esposa impressiona, mas não é tão raro. Quando alguém resolve parar de beber, nem todos dão apoio. Alguns entendem a situação e estimulam. Mas muitos não aceitam. "Você não vai beber nada? Ah, fica chato todo o mundo bebendo e você aí, careta, sem rir das nossas bobagens." "Que graça tem sair pra tomar guaraná?" "Pô, perdi meu parceiro? Que é isso, cara, sem uma cervejinha não dá pra ser feliz!" Ah, sim, já ouvi muita gente dizer: "Eu não bebo, só tomo uma cervejinha de vez em quando." Então tá.

Geralmente quem não bebe também não fuma. E ouve a tradicional piada: "Não fuma, não bebe e não pode." Como se o uso de álcool e tabaco fosse essencial para fazer sexo e aproveitar a vida. Que uisquinho antes, que cigarrinho depois, que nada! Bom mesmo é durante, durante e durante. Quem quer beber e fumar, tudo bem, cada um sabe o que faz. Mas desestimular quem decide parar é muita mesquinhez de caráter. Infelizmente, existem pessoas assim, com personalidade fútil. Como essa mulher, que só queria o marido alcoolizado. Felizmente, ele teve hombridade e saiu por cima.