quinta-feira, julho 14, 2005

"Ghost" e o fantasma do espectador


Já que puxei o assunto de cinema, vou aproveitar para fazer um comentário sobre o filme “Ghost” que venho ensaiando em minha cabeça há vários meses – mas as opiniões vêm desde a época em que o vi pela primeira vez. “Ghost” fez um sucesso tão estrondoso que surpreendeu à própria Paramount, que chegou a pedir que os espectadores que tivessem visto o filme diversas vezes entrassem em contato. Para mim, a fórmula de êxito do longa metragem é bastante clara.

O sonho secreto de todo espectador ou leitor é entrar dentro da estória e conduzi-la ao final desejado. Quantas vezes, vendo um filme ou mesmo lendo um livro ou gibi, temos ganas de falar com o personagem. De avisá-lo que está sendo enganado. Ou mesmo de nos materializarmos na trama para dar uns socos no vilão. Não podemos fazer nada disso. Somos meros assistentes, invisíveis, incapazes de transpor a barreira que separa a nossa realidade da ficção que observamos. “Ghost” realiza esse sonho impossível através de um de seus protagonistas.

Quando Sam (Patrick Swaize) morre e vira um fantasma no filme, ele se torna, como nós, um mero assistente. Fica vendo tudo com indignação, comentando, reclamando, extravasando seu descontentamento, mas não pode fazer nada. Ali, cria-se um vínculo entre ele e a platéia. Sam passa a ser um representante dos espectadores no filme, um de nós, ansioso por se comunicar com os personagens e evitar que sua esposa Molly (Demi Moore) seja enganada pelo falso amigo Carl (Tony Goodwin). Mas, como nós, ele só pode observar sem fazer nada.

Mas, no momento em que o espírito de Sam consegue fazer contato e interferir na estória, é como se cada um de nós estivesse lá, participando do filme, ajudando Molly e levando a trama para um final feliz. A partir de então, cada nova vitória de Sam nos realiza, como se nós é que tivéssemos obtido cada façanha. Essa sensação de que somos nós que estamos direcionando o enredo é reforçada pelo fato de que, a partir de determinado momento, tudo acontece como gostaríamos. Poucos filmes são assim.


Em “O Céu Pode Esperar”, amargamos a frustração da amnésia de Joe Pendleton logo após ter assumido o corpo de um jogador acidentado. O filme termina como se ele tivesse se tornado outra pessoa, sem lembrar de sua namorada quando a vê. Não é o desfecho que esperaríamos. Assim como gostaríamos que Jenny não morresse em “Love Story” e que Romeu e Julieta vivessem para serem felizes para sempre. “Ghost” realiza o espectador de forma quase orgásmica, dando-lhe exatamente o que deseja a partir de certo momento até o final.

Não sou um expert em cinema. Acho que não sirvo para crítico nessa área. Mas certos filmes eu considero perfeitos do ponto de vista de entretenimento e “Ghost” é um deles. Aliás, é curioso como, na música, são cada vez mais raros os artistas e discos que conseguem me entusiasmar. Já bons filmes aparecem ano após ano. Enquanto a indústria do disco precisa recorrer a relançamentos para aquecer as vendas, a indústria do cinema ainda consegue manter o pique.