sexta-feira, abril 21, 2006

O detalhe no futebol

A morte de Telê Santana me motiva a tirar da manga um assunto que havia me ocorrido quando o Grêmio empatou o Gre-Nal e se sagrou Campeão Gaúcho. Como sou colorado, achei que o comentário pareceria um menosprezo à conquista do co-irmão. Mas lembrando do extraordinário desempenho da Seleção Brasileira de 1982, comandada por Telê, acho que as observações serão pertinentes.

Já perceberam como, no futebol, um detalhe ínfimo representa a diferença entre um "trabalho vitorioso" e uma "campanha desastrosa"? Se o Inter tivesse mantido o resultado de 1 a 0 e vencido o Grêmio, todos os jogos anteriores teriam sido iluminados pelo brilho de um título ao final. Mas como o campeão foi o Grêmio, é como se nenhum dos êxitos anteriores do Inter tivesse valor. O Grêmio é que realizou um "trabalho vitorioso". A ele cabem os louros.

O mesmo aconteceu com a Seleção Brasileira na Copa de 1994. O técnico Carlos Alberto Parreira vinha sofrendo críticas sistemáticas. A atuação da equipe era apenas razoável, inclusive amargando um empate. Na final contra a Itália, quem era velho o suficiente para ter assistido à Copa de 70 só lembrava que, naquela ocasião, o mesmo país adversário havia sido aniquilado com relativa facilidade no segundo tempo. Mas a Seleção de Parreira nos fez passar pela agonia do zero a zero no tempo regulamentar e na prorrogação. Aí, na loteria dos pênaltis, um chute mal direcionado de Baggio fez a diferença. Numa fração de segundo, Parreira virou herói. Falou com orgulho de sua campanha em entrevistas, chegando a citar um sucesso de Frank Sinatra para dizer, em inglês mesmo: "I did it my way." Depois do chute ruim de Baggio, a Seleção Brasileira passou a ser a melhor da Copa desde o apito inicial do primeiro jogo.

Aí lembro da Seleção de Telê em 1982. Que time fantástico! Zico, Falcão, Sócrates, Toninho Cerezzo... O Brasil estava dando shows de bola que chegavam a lembrar 1970. Parecia estar escrito nas estrelas que naquele ano aconteceria o primeiro título verde-amarelo da era pós-Pelé. Mesmo no jogo fatídico contra a Itália, Falcão marcou um dos mais belos gols de sua carreira. Mas o sonho morreu nos pés de Paolo Rossi. Aí, todo o lume de quatro partidas vitoriosas se apagou como por (des)encanto. Telê, que havia montado aquele time espetacular, virou bode expiatório da frustração da torcida. A imprensa ironizou que o "futebol-arte" do treinador fracassara. Mesmo assim, ele teve uma nova chance em 1986. E perdeu nos pênaltis contra a França.

O currículo de Telê é grande o suficiente para que entre para a história como um profissional vitorioso. Mas seu "mau desempenho" nas Copas decorreu de detalhes, pequenos azares. Como também aconteceu com Cláudio Coutinho, a quem a Veja chamou de "falso brilhante" em 1978 embora se tenha saído invicto, sem contar aquela suspeita goleada da Argentina contra o Peru. Enfim, no futebol só existem heróis ou vilões, glórias ou ruínas, trabalhos exitosos ou campanhas desastrosas. E a diferença entre um e outro pode estar num detalhe.