quinta-feira, novembro 13, 2008

De novo as falsas autorias

Nesta semana recebi uma crítica construtiva nos comentários do blog. Um visitante, que se mostrou bastante cordato e até me convidou para visitar o seu site, acha que sou muito ríspido com pessoas que se deixam enganar pelas falsas autorias. Ele concorda que é preciso fazer o esclarecimento, mas entende que nem todos são obrigados a conhecer a obra, por exemplo, de Luis Fernando Verissimo. E acredita que, "com um sorriso", consegue-se um resultado até melhor.

Admito que às vezes pego pesado. Mas talvez o nobre visitante não tenha idéia da dificuldade que é convencer os teimosos. Alguns, admita-se, aceitam bem as correções e até agradecem. Mas nem todos. Outros insistem e não é raro chamarem de "chato" a quem toma a iniciativa de esclarecer. Também existem aqueles que, aparentemente, são elucidados, até que logo repassam mais um texto com autoria falsa. Quando se pensa que o esforço de esclarecimento está surtindo efeito, surge um apócrifo onde menos se espera. Chega um momento em que se perde a paciência. Aí, sobra a ironia como último recurso.

Certa vez, nas comunidades do Orkut que combatem a atribuição incorreta de autorias a textos da Internet ("
Afinal, quem é o autor" e "Eu ABOMINO textos apócrifos"), compilei uma lista de "respostas mais freqüentes". Referia-me às diferentes formas com que as pessoas costumam reagir quando são alertadas de quem determinado texto não era de quem elas pensavam (geralmente Luis Fernando Verissimo, Mario Quintana e Arnaldo Jabor). A saber:

"Desculpe, é que recebi por e-mail com o nome dele."

Infelizmente alguns internautas ainda não aprenderam que "receber por e-mail" não é garantia nenhuma de que a informação é segura. Isso vale também para notícias. Por mais detalhes que elas tragam: nomes, números, datas, locais, não importa. Nada recebido por e-mail, em princípio, é confiável. A Internet já tem mais de dez anos e poucos se convenceram disso.

"Como você pode saber com tanta certeza? Você conhece de cor a obra toda dele?"

É difícil para quem tem pouca ou nenhuma vivência de literatura entender que, sim, existem pessoas que conhecem toda a obra de um escritor. Nas comunidades de Mario Quintana do Orkut eu sei de pelo menos três integrantes com essa característica. Nas de Verissimo, uns quatro. Devem existir muitos mais. Podem não conhecer a obra de cor, na ponta da língua, mas já a leram toda pelo menos uma vez. E reconhecem na hora se um texto é mesmo do autor citado ou não. Mas, para quem não tem familiaridade com livros, é mais fácil acreditar em disco voador do que em reconhecimento de estilo literário.

"É dele, sim, acabei de pesquisar no Google e achei milhares de ocorrências com o nome dele!"

A Internet é um campo aberto e o Google é um arrastão. Mas o grande número de ocorrências não transforma o errado em certo. Mais sobre isso adiante.

"Então de quem é?"

Aqui entra o fator "São Tomé". Não basta que alguém com conhecimento de causa afirme, sem o menor resquício de dúvida, que um determinado texto não é de Verissimo, Quintana ou Jabor. O verdadeiro autor tem que aparecer. Do contrário, o incauto vai continuar acreditando que é do escritor famoso a quem foi falsamente atribuído.

"Como vou saber se é mesmo dessa fulaninha aí?"


Ah, sim. Quando o texto chegou por e-mail com assinatura famosa, não foi preciso provar nada. Aceitou-se sem pestanejar que era mesmo do notável escritor. Por outro lado, bastou alguém dizer que não é de Mario Quintana e sim de Maria da Silva, que passou-se a exigir mil provas. Por que não usaram esse critério desde o começo? Por que se supõe que uma autoria está correta quando o autor apresentado é alguém conhecido? Dois pesos e duas medidas.

"Obrigado, eu estava mesmo achando que não era dele."

Então por que repassou?

"Pode não ser dele, mas é bonito!"

É claro que, se alguém repassou um texto, foi pelo conteúdo e não pela assinatura. Mas essa resposta, digamos, "contemporizadora", vem acompanhada de um certo descaso pela autoria. Como se não fosse importante. E, muitas vezes, o "repassador" acredita que, se o autor não é quem presumia ser, ao menos o estilo é o mesmo. Mas nem isso é verdade. Mario Quintana jamais discorreria de forma longa e repetitiva sobre amores e relacionamentos ("um dia descobrimos, blá blá blá..."). Luis Fernando Verissimo não escreve textos românticos ou de auto-ajuda. Logo, ao contrário do que pensam os incautos, os textos falsamente atribuídos a cada um deles não agradarão aos fãs dos verdadeiros escritores. Podem até ser "bonitos" na opinião de quem postou, mas não serão bem-vindos nas comunidades dos autores indevidamente creditados.

"Ninguém é obrigado a conhecer a fundo a obra de um escritor."

Concordo que nem todos são especialistas em literatura. Eu próprio não o sou. Mas então, que não se escreva sobre o que não se conhece. Que não se tente demonstrar um conhecimento que não se tem com observações do tipo "esse tem a cara dele", "só ele para escrever algo tão lindo" e similares. Ninguém precisa conhecer a obra de um escritor. Basta aprender, de uma vez por todas, que e-mails e blogs amadores não são fontes confiáveis para pesquisas literárias. Tem gente que chega a criar sites em homenagem a determinados autores simplesmente na base do "copia e cola". Esse tipo de iniciativa não acrescenta nada, pelo contrário: apenas recicla e dissemina a desinformação. Em conseqüência, aumenta o número de ocorrências do erro no Google, resultando na "falsa confirmação" mencionada antes ("é dele, sim, etc.").

"É impossível ficar conferindo e pesquisando a autoria de tudo o que se recebe."

Simples: se não tem como conferir, não repasse. Nem leia no ar no seu programa matinal da Globo. Realmente é difícil para quem não tem nenhuma referência fazer uma verificação confiável das autorias. Mas existem as duas comunidades do Orkut citadas acima. Tem também "
O verdadeiro Mario Quintana", especificamente sobre a obra do poeta gaúcho. Recomendo ainda a comunidade de Luis Fernando Verissimo moderada por Elson Barbosa. São fóruns onde é possível fazer esse tipo de esclarecimento. Muitas vezes a resposta já está lá, é só procurar. Lamentavelmente, nem todos aprenderam a usar o recurso de busca dentro dos tópicos. Já perdi a conta de quantas vezes vieram perguntar se aquele poema que começa com "não quero alguém que morra de amor por mim" é realmente de Quintana. Sua verdadeira autora chama-se Adriana Britto. Uma simples pesquisa dentro da comunidade tiraria a dúvida, mas a maioria entra estabanadamente só para perguntar e nada mais. Foi por uma atitude como essa que uma integrante foi criticada por outra e retrucou: "Você conhece toda a obra de Quintana e pesquisa tudo?" Ela provavelmente não iria acreditar na resposta, então decidi apagar as mensagens e encerrar o assunto, já que eu era o moderador.

Reiterando: não, ninguém é obrigado a ser especialista em autor nenhum. Mas então que não divulgue nem emita opinião sobre o que não conhece. A única fonte confiável para autorias de textos e poemas são os livros. Não é preciso ser nenhum profundo conhecedor de literatura para entender isso.

5 Comments:

Blogger Delma said...

Emílio
Assino embaixo. Tudo o que vc disse é muito pertinente. Já aconteceu de me mandarem um texto com autoria falsa,eu respondo dizendo quem é o verdadeiro autor e poucos dias depois, a pessoa envia a mesma msg com a autoria falsa. Mas não vamos desistir!

9:36 PM  
Blogger GEANE said...

Meu caro. Adorei seu texto e vou postá-lo em minha página no facebook, que criei especvialmente para combatermos esses texctos apócrifos. Se quiser conhecê-la, está no https://www.facebook.com/Textosapocrifos. Abraços, Geane Botarelli

8:05 PM  
Blogger GEANE said...

Meu caro, adorei! Vou publicar seu texto em minha página do Facebook que trata desse assunto https://www.facebook.com/Textosapocrifos. Abraços, Geane.

8:06 PM  
Blogger Sergio said...

Também circula por ai um texto intitulado "As mulheres são fantásticas!", cuja autoria é atribuída a Drummond. Você o conhece? Duvido que Drummond fosse capaz de cometer tamanha ruindade...

9:53 PM  
Blogger Emilio Pacheco said...

Talvez já tenha lido esse das mulheres. Com certeza não é de Drummond.

9:57 PM  

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