sábado, março 14, 2009

Professores de inglês na berlinda

De certa forma é uma casualidade que, no momento em que se comenta a venda do Cultural para o Wizard e se cogita um possível declínio na qualidade do curso como uma das causas, surge este novo livro do inglês Michael Jacobs. Eu me pergunto se "Como Não Ensinar Inglês" causará alguma reação mais turbulenta junto aos professores de inglês do Brasil. Porque, mais do que orientar, a obra expõe sem misericórdia as deficiências de diversos mestres do idioma com quem o autor teve contato. As consultas enviadas por e-mail a Jacobs são transcritas sem qualquer alteração. No caso das mensagens que contêm erros grosseiros de inglês, apresentam-se as devidas correções. E assim, cada pergunta recebida serve de ponto de partida para um novo tópico. Nenhuma fica sem resposta, mas também não é poupada de uma generosa dose de sarcasmo.

Michael Jacobs critica a preguiça tanto de professores quanto de alunos em "fazer o tema de casa". Em outras palavras, buscar as respostas por esforço próprio. Ele não esconde a surpresa com a quantidade de consultas que recebe, muitas das quais poderiam ser resolvidas com um simples dicionário. Aliás, como bem sabemos, este é um problema generalizado da era da Internet. Houve uma época em que eu tive que colocar uma espécie de FAQ sobre Mario Quintana no meu perfil do Orkut, pois não aguentava mais receber perguntas sobre o poeta cujas respostas estavam na própria comunidade onde o consulente me encontrou. Sem contar aquelas indagações bem vagas, tipo: "Estou fazendo um trabalho sobre Mario Quintana, você poderia me dar algumas dicas?" Pois Jacobs também enfrenta esse problema em relação ao aprendizado de inglês.

O autor aborda ainda a questão do que ele define como "pensamento linear", ou a presunção de que tudo o que se diz num idioma tem equivalente no outro. Ou mesmo de que tudo o que se encontra num país estará disponível em outro. Ele cita como exemplo o "evaporated milk" - literalmente, "leite evaporado" - que ele adorava beber na Inglaterra, mas não existe no Brasil. Assim também, o creme de leite de que os brasileiros tanto gostam não se encontra em terras britânicas. Não existe uma gíria em inglês que corresponda a "pagar mico", mas também não há em português um insulto como "bastard". Sim, existe uma tradução literal, mas nunca se ouve ninguém gritando com agressividade: "Bastardo!" Aqui, permita-me fazer uma defesa: muitas vezes são tradutores que fazem essas consultas, pois encontraram essas expressões em seus trabalhos e precisam achar uma solução.

Jacobs é o autor de "Como Não Aprender Inglês" (que não li, pois após uma folheada rápida concluí que se destinava a estudantes em nível intermediário, o que não é o meu caso) e "Tirando Dúvidas de Inglês" (que está na minha estante). O foco deste último é exatamente as dúvidas específicas de tradução como as citadas acima. Outros livros semelhantes são "Como se diz chulé em inglês" do americano Ron Martinez, e "Break the Branch? Quebrar o Galho", do inglês Jack Scholes. A diferença é que a obra de Scholes se destina a nativos de língua inglesa vivendo no Brasil, enquanto as demais têm como público-alvo brasileiros estudantes de inglês como segundo idioma. Esse, aliás, é um filão que se tornou uma tendência no mercado editorial brasileiro e vem sendo abastecido por autores como Jacobs, Martinez, Scholes e o brasileiro Ulisses Wehby de Carvalho. Mas agora Michael Jacobs tocou num ponto sensível. Em "Como Não Ensinar Inglês", ele escancarou as fraquezas dos professores. Há uma frase em inglês que se encaixa perfeitamente nesse caso: It's a dirty job, but someone's gotta do it (é um trabalho sujo, mas alguém tem que fazê-lo).