domingo, março 13, 2016

Manifestação

Eu lembro da campanha das "Diretas Já". Uma recordação marcante foi uma caminhada feita na praia de Capão da Canoa no verão de 1984. Pesquisando no Google, verifico que foi no dia 19 de fevereiro, um domingo. Entre outros, teve a presença de José Fogaça e Pedro Simon. Terminou no Baronda, com vários notáveis falando ao microfone. O músico Kleiton, da dupla com Kledir, tentou ensinar ao público uma letra adaptada do refrão de sua "Vira Virou": "Já vira virou / a situação deste país / já troca trocou / o Presidente". Poucos se animaram a cantar, talvez porque a ideia não fosse "trocar" o Presidente (na época, João Figueiredo), mas sim alterar em definitivo o sistema de votação.

O sonho das diretas era tão acalentador que possivelmente muitos não tenham percebido um detalhe: o fato em si de se poder votar para Presidente não resolveria todos os problemas do Brasil. Não asseguraria a cada eleitor que "o seu" candidato chegaria à Presidência. Tampouco garantiria que o governante eleito agradaria a todos ou faria uma administração irretocável. E, no entanto, mesmo com eventuais imperfeições, a eleição pelo voto direto continuaria sendo o método mais justo de se escolher o Presidente. O único realmente democrático.

Tenho lido no Facebook alguns argumentos a favor das administrações recentes em relação às que tínhamos no tempo das eleições indiretas. Alguns deles, considero irrelevantes. São falhas que podem acontecer com qualquer governante e, por si só, não justificariam a defesa ao voto direto. Mais do que qualquer coisa, é uma questão de princípios. Hoje a escolha do Presidente está em nossas mãos. Mas é preciso respeitar a vontade da maioria. Em outras palavras: saber ser voto vencido. Uma, duas, três vezes. Quatro vezes. Se não for assim, de que forma será?

As pessoas que não gostam da Dilma deveriam se preocupar com a próxima eleição, não em ficar fazendo carnavaizinhos de protesto que não trazem nada de bom para o país. E, por mais que algumas digam que "só estão exercendo seu direito de manifestação" ou "querem apenas impeachment como foi o do Collor", não foi isso que se viu nas últimas demonstrações. Teve gente sugerindo que a Dilma se suicidasse (ao indicar que seguisse o exemplo de Getúlio Vargas) e apareceu também um cartaz lamentando que "não tenham todos morrido em 1964", referindo-se aos que eram contra a ditadura. Outros são mais sucintos: "Fora Dilma! Fora PT!" Ainda que tudo seja apresentado com uma roupagem festiva e animada, no fundo, é um discurso de ódio.

Não sairei à rua hoje. Sei que, em alguns lugares, também haverá manifestações a favor do Governo. Mas não vejo necessidade de participar nem de um lado, nem de outro. Já me manifestei na urna. E, que eu saiba, meu voto vale por quatro anos. É isso que eu quero ver respeitado. Além do mais, sei que muitos dos que expressarão seu apoio a Dilma também defenderão Lula. Para mim, esse é outro assunto. Não sou contra investigações, nem a favor da impunidade. Minha preocupação é com a preservação da legalidade e do estado de direito.

Estou muito, muito triste de ver a forma como se está fazendo oposição no Brasil. A democracia deveria ser uma coisa bonita.

2 Comments:

Blogger José Elesbán said...

Valeu, Emilio.
Estive no domingo, 13, na Redenção. Você imagina onde.
Gravei o discurso do Olívio, que não coloca panos quentes - https://www.youtube.com/watch?v=rrVxGqSOgFk

Abraço.

9:50 PM  
Blogger Emilio Pacheco said...

Emocionante o discurso dele. Gostei de ver as cores verde e amarela na faixa que pede democracia. A bandeira brasileira é uma só. Na prática, convencionou-se usar o vermelho para significar o apoio à administração legitimamente eleita. A oposição, vestindo verde e amarelo, usa isso como argumento de que eles representam o Brasil legítimo. Mas somos todos brasileiros. Todos tiveram chance de votar. Que se respeite o resultado da eleição.

Gostei de ouvir o Olívio dizer que a luta contra a corrupção não é só da direita. E é preciso reconhecer que muitos participaram das passeatas do outro lado criticando a corrupção de todos os partidos. Houve algumas mudanças isoladas de foco. O problema de isso acontecer assim, de última hora, depois de tantas manifestações em que só se ouvia "Fora Dilma" e "Fora PT", é induzir pessoas de boa fé a engrossarem uma massa onde há um número considerável de golpistas. Se as manifestações tivessem tido esse tom desde o início e com uniformidade, até dava para levar fé.

4:06 AM  

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